A Lei nº 9.271, de 17 de abril de 1996,
deu nova redação ao art. 366, do
CPP, determinando no caput: "Se o acusado,
citado por edital, não comparecer, nem
constituir advogado, ficarão suspensos
o processo e o curso do prazo prescricional, podendo
o juiz determinar a produção antecipada
das provas consideradas urgentes e, se for o caso,
decretar a prisão preventiva, nos termos
do disposto no art. 312".
A nova disposição, advinda com
a finalidade de efetivar as garantias do contraditório
e da ampla defesa, prevê também "igualdade
de armas", na expressão da Profª ADA
PELLEGRINI GRINOVER (Boletim do IBBCrim, n. 42,
Junho/96, Edição Especial, págs.
1 e 2) ao introduzir mais uma causa de suspensão
do "curso do prazo da prescricão, visando
a não incentivar a impunidade e a desestimular
eventuais práticas menos corretas de oficiais
judiciários". O direito processual penal, como os demais ramos
do direito codificado, também admite cautelaridade
específica, para o fim de garantir a efetividade
do processo, encontrando fundamento tanto na norma
processual como na constitucional.
Várias são as medidas cautelares
em matéria processual penal e se referem
à pessoa do próprio acusado,
a determinadas coisas relacionadas com o fato
delituoso e em relação à
prova.
Ao juiz criminal, no entanto, não está
reservado o "poder geral de cautela" previsto
no art.798, do CPC, pois não pode decretar
medidas processuais restritivas da liberdade individual
em caráter preventivo sem que elas estejam
contempladas expressamente na lei e resguardadas
na Constituição (neste sentido TJSC,
in MS n. 97.011018-9, Capital, 1ª Câm.
Crim. J, 30.10.97, invocando-se inclusive a doutrina
do Prof. LUIGI FERRAJOLI), assim como as demais
providências cautelares, denominadas conservativas
ou assecuratórias: buscas e apreensões
(CPP, art. 240), seqüestro (CPP, art. 125),
hipoteca legal (CPP, art. 134), arresto (CPP,
art. 136) nem aquelas pertinentes à prova,
como os depoimentos antecipados ad perpetuam
rei memoriam (CPP, art. 225), o exame de corpo
de delito e as perícias em geral (CPP,
art. 158).
A fonte legítima para privar alguém
da liberdade pessoal é a sentença
penal condenatória transitada em julgado,
observadas as regras do devido processo penal.
A prisão, atendendo aos fins do processo
e cautelarmente (chamada também 'prisão
provisória'), pode se dar antes do
trânsito em julgado da sentença condenatória,
mas limitada ao estritamente necessário,
alinhando-se cinco hipóteses: prisão
temporária, prisão em flagrante,
prisão preventiva, prisão resultante
de pronúncia e prisão resultante
de sentença condenatória recorrível
(em todas, com o risco de o agente vir a ser absolvido
resultando para o Estado a obrigação
de indenizá-lo, não obstante alguns
entenderem o que disposto no inciso LXXV, do art.
5º, da CF - "O Estado indenizará
o condenado por erro judiciário, assim
como o que ficar preso além do tempo fixado
na sentença" - não pode ser
invocado como fundamento para aquele que ficou
preso injustificadamente antes do decreto condenatório
definitivo).
Com estas linhas iniciais, desenvolvem-se as
seguintes questões:
Prisão preventiva - "se for o caso".
- A Lei n. 9.271/96 não restaurou a prisão
preventiva obrigatória; como medida extrema
caracterizada pela privação da liberdade,
tanto que foi chamada de "mal necessário"
(MAGALHÃES NORONHA, Curso de Direito Processual
Penal, 2ª ed., 1990, pág. 192), esta
medida cautelar somente pode ser decretada quando
presentes seus pressupostos especiais (arts. 312,
313 e 314, do CPP); da mesma forma, se desaparecerem
seus motivos, diante do preceito rebus sic
stantibus, o juiz poderá revogá-la,
como de novo decretá-la (art. 316, do CPP).
Como medida cautelar que é, se justifica
por sua tríplice finalidade: é providência
de segurança (da ordem pública e
da ordem econômica), é garantia da
execução da pena e asseguradora
da boa prova processual, esclarecendo o mestre:
"No primeiro caso, evita que o delinqüente
pratique novos crimes e que seja vítima
da vindita popular, do ofendido ou da sua família.
No segundo, garante a execução da
pena, impedindo sua fuga, e, destarte, subtraindo-se
aos efeitos penais e mesmo civis da condenação.
No terceiro, diz respeito à instrução
criminal, obstando a ação do criminoso,
seja fazendo desaparecer provas do crime, seja
apagando vestígios, subornando testemunhas,
enfim, impedindo com sua atitude que a prova seja
o que devia ser. Ela é, assim, providência
de segurança, garantia da execução
da pena e meio de instrução" (ob.
cit., pág. 172).
A suspensão do processo (e do curso do
prazo da prescrição - pelo tempo
da pretensão punitiva respectiva, previsto
no art. 109, do CP - vide JURISPRUDÊNCIA
CATARINENSE, vol. 77/586, 2ª coluna), até
que o réu citado por edital compareça,
não justifica, por si só e ao argumento
de derivar situação de impunidade,
se entenda como necessária a prisão
preventiva com o fito único de garantir
o prosseguimento do processo (art. 366, §
2º, do CPP, com a redação dada
pela Lei n. 9.271/96), vale dizer, preso o acusado,
ter-se-á por cientificado pessoalmente
da acusação, seguindo-se a instrução,
o que implica no fato grave de que, após
sua prisão e apresentação
ao juízo para interrogatório e conhecimento
da acusação, passa a inexistir a
situação que ensejou a decretação
da medida segregatória, sendo tal o motivo
de sua revogação, nos termos do
art. 316, do CPP.
Ora, a Lei nº 9.271/96 não ressuscitou
a prisão preventiva obrigatória,
tanto que o novo dispositivo (art. 366, CPP) previu
sua decretação com a expressão
"se for o caso", o que, segundo DAMÁSIO
E. DE JESUS, "continuam valendo as mesmas regras,
exigências e cuidados anteriores à
nova lei" (vide Boletim IBCCrim nº 42,
Edição Especial - Junho/1966,
pág. 3), não se devendo decretar
medida tão drástica simplesmente
por conveniência ou comodidade em decorrência
de o agente não ter sido localizado ou
porque resida fora da comarca.
Recentemente decidiu o Superior Tribunal de Justiça
que:
"A Lei n. 9.271/96 ... não restaurou
a custódia cautelar obrigatória.
No caso dos delitos apenados com detenção,
a decretação da prisão preventiva
deve obedecer ao disposto nos arts. 312 e 313
do CPP" (RHC nº 6.262-SP, 5ª Turma,
rel. Min. Félix fischer, j. 01.04.97, DJU
05.05.97, in Boletim IBCCrim nº 55,
p. 196).
Assim, e como observa VICENTE GRECO FILHO ao
tratar da produção de prova, antes
de se lançar mão da prisão
preventiva há que se considerar outras
alternativas para utilização prioritária,
lembrando, entre outras situações,
que "é possível apontar a seguinte:
não é caso de decretação
imediata da preventiva em virtude do não-comparecimento
do acusado para reconhecimento, ainda que indispensável.
Antes deve ser determinada a condução
coercitiva" (Manual de Processo Penal, 3ª
ed., Saraiva, 1995, pág. 243).
Aqui a possível solução
para a questão: a condução
coercitiva é medida prevista no art. 260,
do CPP, que deve ser utilizada pela autoridade
judiciária para evitar situações
constrangedoras à liberdade do acusado,
quando desnecessária sua prisão
preventiva.
Argumenta-se para o outro fundamento, da garantia
da aplicação da pena, mas em hipótese
alguma se deve olvidar para a exigência
da presença simultânea do requisito
ético da prisão preventiva, qual
seja, o da sua necessidade: sem ela a sanção
penal que, por acaso, vier a ser aplicada, não
será cumprida em face da ausência
(seria fuga?) do acusado, frustrando a lei penal.
Ora, além das limitações
previstas na própria lei processual penal
(os requisitos inseridos no art. 312, mais aqueles
impeditivos do art. 313, ambos do CPP), hoje,
diante da conscientização da gravidade
da prisão e suas maléficas seqüelas
ao indivíduo, se examina e analisa não
só a necessidade como, também,
sua utilidade, ou seja:
"Em princípio, somente se decreta a
preventiva se houver prognóstico de cumprimento
efetivo de pena privativa de liberdade. Os
requisitos dos benefícios penais, como
a suspensão condicional da pena ou a prisão
albergue, podem não coincidir com a necessidade
da prisão processual, mas, em princípio,
se há prognóstico fundado da concessão
de um desses benefícios e não há
outro motivo legal autônomo (como por exemplo
ofensa à ordem pública por ameaça
à testemunhas), a preventiva não
deve ser decretada. Isto porque, salvo motivo
independente, não há razão
de prisão processual se, condenado definitivamente,
esta não se efetivará "(Vide
VICENTE GRECO FILHO, ob. cit., pág. 244).
No mesmo sentido doutrina ANTÔNIO MAGALHÃES
GOMES FILHO, analisando a questão surgida
com a nova redação do art. 366,
do CPP, dada pela Lei n. 9.271/96:
"Quanto à decretação da
prisão preventiva do acusado ausente, é
preciso ressaltar, inicialmente, o seu caráter
de excepcional antecipação
de um resultado possível do processo;
por isso, não será admissível
nos casos em que a restrição da
liberdade não é normalmente esperada;
essa a razão, aliás, da vedação
da medida nos crimes culposos ou simplesmente
apenados com detenção (art. 313,
CPP), que também se aplica, evidentemente,
à situação disciplinada pela
nova lei.
"Por outro lado, igualmente será a necessidade
da cautela, somada à presença de
prova da existência do crime e indício
suficiente de autoria, que poderá autorizar
a sua decretação. Ao fazer expressa
remissão ao art. 312, CPP, o próprio
legislador enfatiza a cautelaridade dessa medida
de restrição ao direito de liberdade.
"Em resumo, não se trata aqui, como apressadamente
se poderia supor, de um corolário automático
da suspensão do processo pela ausência
do réu. Semelhante entendimento viria a
colidir, inclusive, com o preceito constitucional
da presunção de inocência
(art. 5º, inc. LVII), que embora não
vede as prisões anteriores à condenação,
torna, certamente, inadmissível a prisão
processual obrigatória, banida de nossa
legislação pela Lei nº 5.349,
de 1967" (Medidas Cautelares da Lei 9.271/96:
produção antecipada de provas e
prisão preventiva, in Boletim do IBCCrim,
nº 42, Edição Especial, Junho/1996,
pág. 5).
Adotando esta linha garantidora da liberdade,
no Tribunal de Justiça deste Estado vem-se
decidindo, em situações surgidas
com a Lei n. 9.271/96:
"RECURSO-CRIME - SENTIDO ESTRITO - SUSPENSÃO
DO PROCESSO (ART. 366, CPP - LEI Nº 9.271/96)
- RÉU REVEL - PRISÃO PREVENTIVA
- DESNECESSIDADE - DESPROVIMENTO.
"O fato de o réu ser revel, citado por
edital e sem defensor constituído, não
justifica, por si só, a decretação
da prisão preventiva por conveniência
da instrução criminal; salvo motivo
independente (ameaça a testemunhas, destruição
de provas, etc.) não há razão
para a prisão processual se, em havendo
prognóstico de eventual condenação
à pena privativa de liberdade, esta não
se efetivará diante da presença
de requisitos à concessão dos benefícios
penais, como suspensão condicional da pena
ou prisão albergue" (Recurso Criminal nº
96.011412-2, de Jaraguá do Sul, j. 17.12.96,
dentre outros).
Por isto, ainda que o acusado não atenda
ao chamamento judicial e deixe de constituir advogado,
a prisão cautelar só pode ser decretada
em casos especiais e necessários para garantia
da ordem pública ou econômica (art.
86 da Lei nº 8.884, de 11.06.94), segurança
da produção das provas urgentes
ou da aplicação da lei penal (CPP,
art. 312), não se a justificando também
para conveniência da instrução
criminal, salvo se estiver agindo de forma a colocar
em risco a colheita de provas pela destruição
intencional de vestígios, ocultação
de objetos e produtos do crime, ameaçando
ou pressionando, de qualquer forma, testemunhas
e vítimas.
As situações especiais uma vez
presentes devem representar uma probabilidade
concreta de dano em função do retardamento
do processo, isto é, havendo uma razoável
probabilidade - fumus boni juris - de que
a demorada solução da lide possa
ocasionar algum dano à ordem pública,
econômica, à instrução
criminal e à efetiva aplicação
da lei penal, ter-se-á como justificada
a prévia prisão do acusado, lembrando
que o exame dessas hipóteses, que compõem
o periculum in mora, confunde-se com o
mérito da ação cautelar,
como aponta ANTÔNIO ALBERTO MACHADO (Prisão
Preventiva, Ed. Acadêmica, p. 59).
De outra parte, na jurisprudência catarinense
encontram-se precedentes (vide HC nº 96.006945-3,
de Chapecó, j. em 03.09.96) estribados,
inclusive, em julgados do Colendo Supremo Tribunal
Federal, no sentido genérico de que "A
fuga do acusado ou mesmo a sua escusa em atender
ao chamamento judicial, dificultando o andamento
do processo, retarda e torna incerta a aplicação
da lei penal, justificando a custódia provisória,
que serve para assegurar o provimento definitivo
do juiz, no processo penal" (RTJ, 125/586).
No entanto, tais julgados tiveram em vista garantir
aplicação da lei penal, especialmente
dentro do prognóstico de que, se condenados
os agentes, seriam privados de suas liberdades,
porquanto as sanções possíveis
estariam em limites que não permitiriam
qualquer benefício, como suspensão
condicional da execução da pena
ou mesmo o albergue (regime aberto).
Diante disto conclui-se não ser possível
nem recomendável, posto não necessária
nem útil, a generalização
da decretação da prisão preventiva
do réu que, citado por edital e embora
decretada sua revelia não constituiu defensor,
quando se verificar que, ao final, caso condenado,
pelo crime perseguido e diante de suas condições
pessoais, dificilmente será privado de
sua liberdade, salvo seja for apontada e comprovada
razão plausível que a justifique
(excluída a própria contumácia,
observada a advertência de HÉLIO
TORNAGHI, citada por ANTÔNIO ALBERTO MACHADO,
de não se justificar a prisão preventiva
pelo simples comodismo e "a facilidade de ter
o acusado sempre à mão" - Manual,
vol. II, p. 624 - apud ob.cit. p. 63).
A produção antecipada de provas
consideradas urgentes com o processo e o curso
do prazo prescricional suspensos.
Segundo o novo art. 366, do CPP, apesar de suspenso
o processo, o juiz pode determinar a produção
antecipada das provas consideradas urgentes.
DAMÁSIO E. DE JESUS, naqueles comentários
iniciais sobre a Lei n. 9.271/96, afirmou:
"Provas urgentes: casos de necessidade
de testemunha ausentar-se da comarca, velhice,
doença (p. ex.: iminência de cirurgia
cardíaca) etc., que inspirem ao Juiz receio
de que não possam ser produzidas no futuro
(CPP, art. 225). Não se trata, pois, de
antecipar-se a realização de qualquer
prova, como v.g., a testemunhal, sob a alegacão
de que é comum não se encontrar
pessoas que devam depor em Juízo por razões
de mudança de residência, morte etc.
Caso contrário, não teria sentido
a qualificação "urgentes" empregada
no texto (Boletim do IBCCrim citado, p.
3).
ANTÔNIO MAGALHÃES GOMES FILHO, com
a segurança de sempre, expôs no mesmo
Boletim (p. 5) que as medidas cautelares são
os meios que visam a propiciar condições
para o êxito das tarefas de conhecimento
e execução que justificam e autorizam
a inversão na ordem das coisas no processo,
representando instrumento para a eficácia
da atividade processual, acrescentando:
"Mas, como já se disse, somente em circunstâncias
muito especiais é possível adiantar
providências processuais; em primeiro lugar,
é exigível pelo menos a razoável
probabilidade do futuro reconhecimento do direito
posto como fundamento da cautela (fumus boni iuris);
além disso, também deve estar demonstrado
o perigo de insatisfação daquele
direito, em face da demora na prestação
jurisdicional definitiva (periculum in mora).
"Essas considerações elementares
são fundamentais à exata compreensão
de duas previsões da recente Lei n. 9.271,
de 17.04.96: a produção antecipada
de provas consideradas urgentes e a decretação
da prisão preventiva do acusado.
"Trata-se, evidentemente, de medidas de natureza
cautelar (excepcionais, portanto), cuja adoção
depende, certamente, da avaliação
dos pressupostos acima indicados.
"A primeira objetiva assegurar os elementos probatórios
contra a ação do tempo e somente
o perigo de desaparecimentos de suas fontes ,
que poder autorizar a providência. Aliás,
o próprio CPP, no art. 225, já admite
a antecipação da prova testemunhal,
quando o depoente tiver que ausentar-se ou, por
enfermidade ou velhice, recear-se que já
não exista ao tempo da instrução
criminal. E relativamente às provas materiais,
também é o perigo de seu desaparecimento
que inspira as disposições relacionadas
à busca e apreensão (arts. 240 e
seguintes).
"Essa antecipação na colheita da
prova não dever ser, certamente, uma rotina
nos casos em que houver a suspensão do
processo diante da ausência do réu
citado por edital, mas providência resultante
da avaliação do risco concreto de
impossibilidade na obtenção futura
das informações necessárias
ao êxito da persecução. Caso
contrário, de nada valeriam as disposições
da nova lei, seja no tocante à economia
processual, seja relativamente à garantia
de uma defesa efetiva".
TOURINHO NETO, citando TOURINHO FILHO, argumenta
para o fato de a memória da testemunha
enfraquecer com o tempo e sustenta que a prova
testemunhal deve ser considerada urgente, devendo
ser produzida durante a suspensão do processo,
ainda que fora das hipóteses do art. 225,
do CPP (Revista da AMB, ano I, nº 01, p.
42). Fundamentam-se no disposto no art. 92, do
CPP, que dispõe que, sendo suscitada questão
prejudicial, o curso da ação penal
ficará suspenso, "sem prejuízo,
entretanto, da inquirição das testemunhas
e de outras provas de natureza urgente".
O art. 93, do CPP, contém idêntica
previsão ao tratar da suspensão
do curso do processo "após a inquirição
das testemunhas e realização das
outras provas de natureza urgente", estas que
são definidas por JÚLIO FABBRINI
MIRABETE como busca e apreensão, vistorias,
perícias, etc. (Processo Penal, Atlas,
6ª ed., 1996, p. 204).
Penso que não se pode generalizar com
a aplicação conjugada dos textos
citados para entender-se, sempre, como urgente
a oitiva das testemunhas e das vítimas,
com pretexto aleatório de mudança
de endereço, de esquecimento quanto aos
fatos e até falecimento, hipóteses
estas que "poderiam inviabilizar a verdade real
sempre almejada no processo penal" (VICTOR EDUARDO
RIOS GONÇALVES, Boletim IBCCrim, n.
42 citado, p. 7/8).
A suspensão do processo em decorrência
das questões prejudiciais previstas nos
arts. 92 e 93, do CPP, tem como pressuposto a
presença do réu, ou pelo menos que
foi citado pessoalmente (é necessária
ação penal em curso - STF - RTJ,
71/46), difere da suspensão introduzida
no art. 366 (não houve citação
pessoal nem constituição de defensor),
esta com escopo maior de dar efetivo cumprimento
às garantias constitucionais (inclusive
advindas de normas convencionais - especialmente
da Convenção Americana sobre Direitos
Humanos, ratificada pelo Brasil com a promulgação
do Decreto n° 678, de 06.11.92). São
situações processuais distintas,
que não justificam se possa qualificar
de forma generalizada toda prova testemunhal como
urgente.
O simples risco de a testemunha ou a vítima
vir a fragilizar sua memória com o decurso
do tempo, é circunstância que sempre
existiu e é uma realidade nos processos
que fluem normalmente mas com instruções
lentas; muitas vezes as testemunhas são
inquiridas anos após os fatos e porque
não há revelia não se cogita
de antecipar suas ouvidas; em vinte anos de exercício
na magistratura, nunca vi processo com tal providência.
Haveria tratamento diferenciado: para o processo
suspenso nos termos do art. 366,do CPP, seria
produzida a prova testemunhal antecipadamente
e, para aquele não suspenso mas de curso
demorado, se aguardaria o momento incerto da inquirição
futura ...
Nesta linha de entendimento, afastada a "ginástica
jurídica" que se tem realizado para justificar
a generalizada produção da prova
testemunhal de forma antecipada, tenha-se presente,
como anotam EDUARDO REALE FERRARI e ROSIER BATISTA
CUSTÓDIO, que "o que se visou foi possibilitar
a antecipação da produção
de provas apenas quando presente o receio, o temor
de que a prova testemunhal não será
mais possível no futuro, vez que incerta
sua produção e sua eficácia
após muitos anos", aduzindo que não
há justificativa "para antecipar-se todas
as oitivas das testemunhas de acusação
com base na incerta dificuldade posteriori
de serem as mesmas encontradas ou de não
se lembrarem dos fatos, pois tais justificativas
quando aplicadas genericamente tornam perigosas
e inadmissíveis presunções"
(Boletim do IBCCrim, n. 56/Julho/97, p. 10).
A solução deve ser mesmo de interpretação
restrita da permissão contida no art. 366
("... podendo o juiz determinar a produção
antecipada das provas consideradas urgentes e,
se for o caso, decretar prisão preventiva,
nos termos do disposto no art. 312"), porque,
quisesse o legislador que toda a prova testemunhal
fosse considerada urgente, para o fim de sua produção
antecipada, a teria previsto no mesmo modelo daquele
contido nos arts. 92 e 93. Melhor seria, então,
tivesse escrito: "suspenso o processo após
a inquirição das testemunhas...".
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